O GRITO
Eu sou um otário porquê sofro.
Eu sou um idiota porquê perco.
Eu sou um solitário porquê me deito com a tristeza.
Eu sou esquisito porquê sou diferente.
Eles não.
Eles são espertos porque
Os espertos não sofrem.
E se sofrem, sofrem calados.
Eles são inteligentes porque
Nunca perdem.
Só querem a maior compensação
Em tudo o que fazem.
Enquanto eu ainda só
Não perdi o direito de perder.
Eles nunca estão sozinhos.
Sempre compram suas companhias,
Ou se vendem para a companhia
De outrem.
Eles são perfeitos e semelhantes em tudo.
A sociedade do querer
Quer.
Quer tudo de todos.
Querem seus risos e suas lagrimas.
Querem seu corpo e sua alma.
Querem os seus osso e a sua gordura.
Querem aproveitar o tempo.
Tempo pra que?
Tempo é dinheiro.
Dizem eles.
Fugimos da dor
Esquecemos que
Nascemos para beijar
A sua boca amarga.
Fingimos que a morte
Não existe.
Jogamos fora anos,
Décadas de vida
Pensando em um futuro que
Pode jamais chegar.
Não levamos nossas criancinhas
Aos velórios, não freqüentamos
Os cemitérios.
As mulheres são tratadas
Como fast food.
Simples pedaços de carne
Que despertam fome.
Meu corpo não é pra mim.
Nossos corpos são
Moedas de troca.
Sociedade do prazer imediato.
Ferimo-nos sentimentalmente
Para satisfazer um desejo
Incutido por osmose
Em nossas patéticas cabeças.
Chega de Gisele Bunchein,
Eu quero é mulher
Não um produto deprimente,
Formado por homens que
Não gostam de mulheres.
Engraçado vivemos num dos
Piores lugares do mundo.
Onde a desigualdade social
Ultrapassa a absurda linha do absurdo.
E nossa sociedade frenética
Não aceita a derrota ou o fracasso.
Sendo que já nascemos
Tristemente condenados a esta situação.
Então nos apegamos desesperadamente
A valores pequenos, medíocres e vulneráveis.
Esses serão nossos troféus.
Uma porrada de quinquilharias
Que nos empurra a cada dia,
Para o mais profundo desespero.
Vivemos para os outros.
Escravizados por pessoas que nem conhecemos.
E nem percebemos isso.
Ó amaldiçoados que tem olhos
E não enxergam!
Até quando terei que ver,
Vocês sendo usados como
Combustível barato
Por esta maquina que os homens criaram?
Vocês são homens?
Então tudo,
Verdadeiramente tudo,
Pode ser mudado por vocês.
Os homens criaram tudo
O que vos aprisiona.
Os criadores desta sociedade
De tortura já morreram.
É a nossa vez de fazermos
As regras do jogo.
Não ler a cartilha que nos
Deram quando entramos neste circo.
Até quando terei que chamar
A vossa atenção?
Até quando vocês viveram
Sem saber jamais
O que é a pesada alegria
De ser alguém?
Até quando terei que em afundar
No sofrimento para
Sairdes deste confortável entorpecimento?
Veja eu sangro.
Veja eu choro.
Veja eu perco.
Veja eu sou só.
Veja eu sou um homem.