O PÁSSARO SOU EU

Rasgo o céu com tremenda velocidade, com minhas asas equilibradas e sentindo o céu em mim e o vento em minha boca. Sou pássaro que voa rasgando os céus da cidade, evitando os fios de alta tensão, desviando dos arranha-céus, entre calores e frios.

Sou pássaro sedento de uma árvore florida, ipê com cachos amarelos, pendendo no ar. Lá me assento e olho o tempo e vislumbro o mundo com olhar de viajante, puro, singelo e simplesmente com novo desejo de voar.

Abro as asas, e no meu peito sinto um rasgo, forte, amargo, doído e vou ao chão! Alguém estinlingou-me o peito...pequeno sou, caibo na palma de uma mão. Não posso voar, temo morrer, não sei chorar.

Ouço passos na grama verde, estalando alguns gravetos. Receio que seja o homem que me feriu. Quero fugir e não posso. Estou sem asas para voar... Olho a amplitude do céu e lembro que ainda a pouco, revolucionava o ar com meus rodopios.

Surge como um gigante, uma mão....medo, é o que sinto então. È uma criança, com olhos de pássaro e me põe nas suas mãos em concha. Meu corpo pequeno, tremula enfraquecido, sangra.

Menino corre e entre seus dedos entra uma brisa mansa. Sinto que despeço dos céus, que por alguma razão alguém me quis tirar-me a vida. Menino corre... menino voa como pássaro...e vôo meu último vôo nas suas quentes mãozinhas de criança.

Dou meu último suspiro e adormeço para sempre.

Eu sou o menino que vi pássaro morrer nas minhas mãos...eu sou o menino que aprendeu a amar de verdade, quando corria pelos campos para salvar aquele pequeno ser que sofria.

Eu sou o menino que virou homem e que jamais desejarei ter nas mãos um estilingue e um pássaro sem vida.

E os homens continuam a usá-lo : nas inocentes aves e contra uns aos outros. Prefiro que me rasguem o peito com uma lança, do que ser aquele que não tem mais olhos de criança.

Sou homem-pássaro e te convido para um vôo sereno...feche os olhos...estamos neste exato momento plainando no céu.

Ainda que corramos riscos, nosso vôo é calmo...e assim, erguemos nossas asas em busca de um novo ipê florido, para olhar languidamente a doce beleza da vida.

Voe sem temer, pois só os que possuem a capacidade e a coragem para voar, podem desfrutar de novas e belas paisagens.

09/02/2005