AS CASAS

casas com formatos de cabras

se remendando imitando uma caixa

tudo zumbe

a elas são coladas

novas fórmulas e formatos

pentes e sapatos femininos

desenhos e radiolas de meninos

brinquedos e remédios de anciãos

donzelas aguardam na torre

sem promessa de príncipe ou resgate

nas casas há meninos magros

nas casas há meninas mortas

nas casas há mulheres e navios

porém os últimos condensados em forma de assovio

nas casas atômicas e sem céus

os retratos são feitos de paisagem

que se movimentam e até mordem

os ratos telegrafam sem rota ou licença

as saudades são sentidas

como se sente a presença de um bicho

estarrecido sai o grito do menino

mas um grito sem pulmão

um grito cariado e sem ressonância

um grito sem mensagem e desinteressado

nas casas tudo geme

nas casas o correio não bate palmas

as mãos temem qualquer aplauso

nas casas a comida não é solene

tudo é comido em si mesmo

sem glórias e sem talheres

nas casas não há vida noturna ou recreios

seu expediente é como numa repartição pública

nas casas não há pessoas

são nelas que o censo erra

nas casas não há casas

nas casas o nada é uma realidade

cheia de coisas de se pegar

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 07/12/2008
Reeditado em 19/08/2013
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