Sós

Ontem havia crianças na rua

Quase nuas

De amor próprio só havia as reações à indiferença:

Da minha passagem por elas

Da passagem dos outros

Da de todos enfim.

Hoje também havia

Agora mesmo estão lá

Andarilhos

Nas calçadas e praças

Nos semáforos e sob os viadutos

Nas portas fechadas das lojas e bancos do centro

São os símbolos da chaga administrativa

Troféus da vitória da miséria sobre o sistema

Cheirando a sujeira

Barrigas roncando de fome

Inebriados pela cola que os faz sonhar com um mundo imaginário

No qual existem como gente que na verdade deveriam ser

São pivetes

Não vão ter uma cama

Nunca terão quarto com ar-condicionado

Nem sonham ter um play-station

Não sabem o que poderiam desfrutar

Só têm a si