O que me faz eu
O que me faz melhor neste mundo:
É respeitar a constituição
Acordar seis dias na semana bem cedo
Sair do trabalho ao findar da tarde
Não reclamar do meu salário de fome
Não desejar o que o meu dinheiro não possa comprar
Não satisfazer o meu ego com o démodé
Não utilizar do meu sexo para me satisfazer
É doar o que não tenho a quem nunca teve
É comprar um bilhete de loteria
E não brigar com quem me furta o capacete
É vender a vida de outros para legitimar o poder
E pagar a força (energia elétrica) que nos mantêm ligados neles
Saldar a dívida da água que sacia a sede
E o tributo da casa onde vivo ladeado de paredes
O que me faz pior nesse mundo:
É gritar alto que injustiça é o proletariado
Desacreditar a política e o pecado
E ao invés de Beatles enaltecer os Secos & Molhados
É caminhar a pé descalço pelas ruas
Transar a alegria da minha gordura
Fantasiar-me de Xuxa em todo Carnaval
É buscar entre detritos a primeira refeição do dia
E ser acordado pelo padeiro abrindo o estabelecimento
É vender o corpo pelo pouco que sustente
É me prestar aos sonhos utópicos de amar além da beleza
Substituir o branco pelo preto como a cor da pureza
E sempre, sempre reclamar dos erros
Ainda que houvesse chance nessa vida
De encontrar as respostas mesmo desfalcadas
Saberia ao certo interpelar o dono
De toda a burocracia?
Ao submergir profundamente em meu ego
Apenas para descobrir o que realmente
Me torna o que nem sei se sou
Mas esvair por um segundo a consciência
Pela necessidade e desvendar o que me faz
Eu ser o que sou