415

Ao adentrar o 415

Sempre impossível seu fundo vê-lo

Tecido humano embaçado

Os afoitos se roçando a cada freio

Carregador de labuta pra Zona Sul

E da Zona Sul a Central

Do Navio negreiro tem parecido papel

Do ônibus ao menos se consegue

enxergar um cantinho do céu

Estamos todos na mesma condução

Mas persiste uma esquisita separação

De concepção.

Quase psicológica.

Uma catraca tem o poder de definir?!

Quem mora no asfalto

Antes da catraca se amontoa

O motorista se afoba

Um velho chuta a porta

Enquanto isso após a catraca

A massa em tons preto-pardos

Já ditos, embaçados

Seguem impacientes pela central, todos putos.

Quando descem as domésticas

Os nordestinos

Os pedintes

Os catadores

Os moleques de rua

Os banhistas-favelados

Ou favelados-banhistas

Que seriam só banhistas

Caso não fossem favelados

Quando desce toda esta massa

Sempre se observa por detrás da catraca

A aflição, o ato de guardar o celular

É a central,

Vai descer os vagabundo e os marginal

Depois da Central parece outro ônibus

Motorista aumenta o ar

Só se vê gente branca

Todos mexendo no celular

Será que esse povo sabe

Que quem deu a ordem pra não roubar

Mora lá no alto do morro

E sua farda é uma AK?!

Pois deve ser engano

Gente dessa classe em minha terra

Só anda na beca

E tem carro do ano

Não se trata de gente rica

Estes que não suportam o cheiro de suor do ônibus

Por isso me causou espécie

E fiz poesia do meu espanto

Se trata dos indiferentes

De gente inculta e ignorante

Que emula grana e sagacidade

Mas só tem “samba” fraco e trabalham segunda

Uns chamam de pequena burguesia

Na minha área de playboy, de bacana

A maioria os conhece por classe média

Uma que se sente classe dominante.