ode noturna
“Então passei à contemplação da sabedoria,
e dos desvarios, e da doidice;...” Ec. (2:12)
o que será depois de
tudo isso?
depois da madrugada?
da ginástica rítmica?
dos sons maviosos?
do afago
da carne
do rito
do riso?
o que será
depois das cantilenas?
das janelas debuxadas aos ventos
polutos?
das faíscas e gozos
e dos raios vívidos no fogo interior?
o que será depois do sol
depois das claridades
e das buscas loucas no frenesi
dos templos?
depois das jornadas per
corridas
nas comédias patéticas?
o que virá
depois das chuvas
das tempestades
das cidades em chamas
nos lençóis da noite?
o que será depois
dos desvarios
dos desvios
de tantos caminhos?
e depois desta rua
deste chão
deste deserto...?
uma luz apagada
– uma não-luz
um espaço cansado suado molhado
um corpo vazio
um copo vazio
uma porta (uma ponte?)
uma rua bêbada
uma cidade nua
um corpo que sai
um corpo distante
da porta
(da ponte)
só um ponto...
um ignoto ponto
diluindo-se
diluindo-se
diluindo-se
no líquido urbano
da incerteza...
Sidnei Garcia Vilches. (maio de 2003)