Poesias das rotinas que deram errado
As pequenas missões da vida,
Que nos incutem objetivos imediatos
E com ônus irreparáveis
Caso sejam ignorados.
O primeiro dos quinze dias de descanso,
Despertar com carinhos de sua companheira
Que não compartilha do mesmo benefício que você.
O relógio não aguarda, um minuto a menos é um minuto que se atrasa
Tempo contado para coar o café.
Ao levantar da cama e andar para a cozinha
A primeira missão que se apresenta no dia:
Tem água para todos os lados.
O encanador foi chamado, o diagnóstico foi dado:
Casa velha, canos velhos. Reparo imediato.
Quebra os azulejos, remove o concreto encharcado
O encanamento tem um enorme rachado,
Que causa uma tempestade parede à dentro.
Cano arrumado, registro ligado:
Mais um cano estourado,
Mais um azulejo quebrado,
Mais um pedaço rachado.
Troca o culpado, espera um minuto
Limpa o suor da testa, bate um papo enxuto;
Teste do papel para ver se há agua escorrendo,
Encosta com mais força do que se deve, um barulho diferente vem surgindo
É a porcaria de mais um pedaço do cano que está ruindo.
Se não fosse a presença de outra pessoa,
Mais azulejos seriam quebrados. Mais canos seriam estourados,
Jogados ao chão, pisoteados.
A marreta voaria,
Acertando vidros de janelas que nada tem a ver,
Aterrissando no chão de piso velho que com certeza viria a ceder,
Assustando os animais que já estranhavam as marteladas.
Reparo concluído até a metade - os canos ainda estão a mostra
Mas pelo menos as pegadas não marcam mais o chão,
Estragando a sensação de limpeza,
Que havia sido concluída no dia anterior,
E agora deverá ser repetida tão de repente,
Pois o cano aparente também denota,
Que todo concreto que não está na parede,
Estará em outra superfície que não deveria.
Dinheiro gasto fora do orçamento,
O descontentamento estampado no rosto
De quem contava as moedas para comprar o almoço
E agora questiona se terá o que jantar.
Mas algo ruim sempre pode piorar,
E magicamente, depois da obra acabar,
A privada parou de funcionar.
Se era bosta que queriam, é bosta que vai ter
Levando ao êxtase os espíritos do Azar e do Revés,
Que trocavam turnos conjurando absurdos em minha direção.
E naquele segundo, onde o pacote não é despachado,
Sendo caçoado pelos fantasmas acima citados,
Sentindo o peso nos bolsos, o dia arruinado;
Encho com toda força meus pulmões
Preparado para soltar um grito,
Acontecendo assim um dos piores cenários:
Engoli a porcaria de um mosquito.
Catapultei-o para fora de minha garganta,
Soltando com ele um pouco de ranho,
E tossidas de um corpo aflito:
Engasguei com a minha saliva,
Daquele jeito desesperador,
Que perde-se momentaneamente o controle,
Nenhum ar sai, nenhum ar entra
Nada se movimenta;
O sufocamento é logo ali.
Olhos arregalados, respiração lenta e profunda
Reparando os estragos do encanamento interno,
Certificando-se que passou o engasgo,
Dando até logo ao inferno,
Recuperando a compostura,
E descontando toda a raiva acumulada,
Pisoteando o mosquito ainda preso em seu catarro,
Como se fosse feito de titânio,
Tamanha força empregada na pisada,
E quantas vezes foram repetidas.
Triunfante com a vitória esmagadora,
Premiou-se com um pouco de descanso,
Apenas para sentir água em seus pés,
Ouvir os risos do Azar e do Revés,
Olhar para trás e ver,
Que sua cozinha estava alagando.