Monótono monólogo

Monótono monólogo

Autor: Tony R. M. Rodrigues

São José, SC, 08/06/2023 - 9h40.

I

A cada dez minutos adormeço

durante o meu trabalho, se frustrado

eu fico com o que nem bem conheço,

só sei que é terrível esse estado

em que parece que, do Nilo, aquela mosca

que causa uma doença que adormece

parece me rondar, sedenta e tosca

e eu não sei mais o que fazer ao que acontece:

de um lado está a praga da Ansiedade,

de outro a peste da doença do sono

e ao centro um velho trauma de abandono.

Eu sei: desde pequeno que te aporrinho,

oh velho, frágil e sumido padrinho

mas nunca quis ser pedra em teu caminho.

II

Então, se tu puderes, a este pedinte

afilhado, que já conta agrisalhada

fronte, peço seres meu ouvinte

por cinco minutos nessa caminhada.

Quero contar-te de um mundo a que pertenço

tentando trabalhar com sono que não venço

e um vicío que não me deixa quieto:

ficar contando areia em meio ao chão deserto.

Não entendo mais a máquina que opera

a mão que rapidamente fizera

o corte de cabelo de Medeia.

Senhoras chegam fofocando, salão cheio,

e eu no meio do salão, contemplo,

tão fino templo que confunde minha ideia.

III

- Coisa de adultos, criancinha linda!

- diz-me uma senhora com o seu Lulu,

e eu sei que a Pomerânia é longe p'ra chuchu

e muito perto senta-se Dona Florinda.

Houve outras vezes que ao cabeleireiro

eu visitei, bem quietinho, com meu pai

e minha irmã, num tempo que já vai

tão longe como a sombra de um candeeiro.

Se homem ou mulher, quem me cortava

minhas franjas, a face sempre alisava

e me dizia que eu era muito especial.

Hoje duvido cem por cento desse acerto

mas por espelhos eu cresci, e hoje estou certo,

que, às vezes torto, o meu reflexo é normal.