Vagão

Era pra ser

O último poema escarrado

Naquele dia.

Escrito com a substância

Escorrida do esgoto

De mim.

Pleno, arraigado,

Fedido.

Era pra ser o poema

Da putrefação

Decomposto em sons

Minimalista

De todo o ódio

Antídoto do mal

Descascado

Dessa ferida supurada

Depois da queimadura

Que sofri

Do seu nojo ácido.

Era pra ser o poema

Mais tóxico

Costurado na fumaça

De suas cinzas.

Palavra por palavra

Sem as vírgulas

Nem os esparadrapos

De limitações.

Logo não foi

O último

Nem a ocasião.

Porque o tudo

Relativizado

Não é absoluto.

É o luto da ocasião.

Passa a ser

Sermão

Passa a ser o pano

Asseio e assédio

Do que deveria ser

De fato.

E o poema retrato

Não retrata

A sua dor visceral.

O poema vira cura

E sua loucura

De se querer vida.

Não é mais o último

Mas o recomeço

Do acerto

Dos seus erros

Nunca existidos.

O poema está de luto

Não se garante claro

É obscuro

Por tempo indeterminado.

Marcus Vinicius