Bala prometida
Mantaram meu irmão
Não sei se polícia ou ladrão,
Ele estava na escola
Quando começou a operação.
Na aula de Sociologia,
A professora esclarecia
O que é ser cidadão.
Mataram meu irmão,
Ninguém sabe como aconteceu.
Nada se sabia sobre o perigo,
Escola era para ser abrigo,
Lugar a ser protegido.
Quando se ouviu o primeiro tiro
Nem deu tempo de correr
Ninguém conseguiu se proteger
Acertaram o meu irmão
Bem no seu coração
Não foi na "cabecinha"
Como ironicamente se dizia
Nem deu tempo de socorrer.
Agora querem meu irmão homenagear,
Disseram que à escola
Seu nome irá ganhar,
Como se isso fosse
As lágrimas de minha mãe encerrar.
Tiraram de nós o direito
De gritar no seu funeral,
Cobrando das autoridades
Uma justiça de verdade,
De poder levar os assassinos
À corte marcial.
Como lutar por justiça
Quando não se conhece os autores?
Morreu sem direito à justiça
Como tantos pobres favelados
Que todos os dias têm seus direitos arrancados.
Meu irmão, menino estudioso,
Queria ser doutor,
Falava em trabalhar
No "Postinho" perto de casa;
Em ajudar a comunidade
Que vive doente
Lutando para sobreviver.
Escola deve ser sinônimo de esperança,
Morte de um estudante
É metáfora de fracasso!
Descreve o descaso
Com o futuro das pessoas
Daquele lugar
Meu irmão é só mais um preto pobre
Que passa às estatísticas participar.
Nas redes sociais,
Apareceu um animal,
Travestido de homem de "bem",
De "índole" e "moral",
Questionando o porquê
Da morte de meu irmão,
Tachando-o como marginal.
Como um estudante
Armado de livros
Em sua aula pode perigo oferecer?
Só se ele reflete o conhecimento,
Esse sim é para temer.
Conhecimento traz esclarecimento
De nossos direitos
Aos quais devemos recorrer
Para que nunca mais
Tragédias como essa
Outras famílias venham a sofrer.