As vozes perdidas no tempo.
Se as velhas estruturas de Soteropólis falassem.
O que diriam as casinhas aportuguesadas da Ribeira?
Os dias de maresia das famílias lisboetas, recém chegadas do além mar, pátria de Cabral.
As pedras seculares do Pelourinho gritariam as dores dos açoites e sangrariam o sangue dos milhares de meus ancestrais.
Meus, teus, nossos e de vossos pais.
Os grilhões estridentes, a falta de ar por afogamento, o sal a queimar os pulmões... e por fim, do martírio escravagista ao piedoso acalanto de Yemanjá, tentando da dor libertar os filhos, trancafiados nos porões dos tumbeiros.
O que cochichariam as pedras, paus e ferros do mosteiro de São Bento?
As rezas murmuradas, as preces abafadas, pelos planos da coroa...
Os jesuítas deicidas, a matar nossos sagrados Deuses autóctones.
Desvirtuando e silenciando nossa língua materna, punindo severamente aos que não aceitassem a imposta madrasta.
Ai quem dera eu ser um poderoso necromante para devolver a voz do indígena enterrado na Avenida Sete.
Para numa breve eternidade, ouvir dele toda a verdade.
De seus momentos em vida e dos segredos do reino da morte.
Se as velhas estruturas da minha cidade falassem, eu faria da boca uma terceira orelha.
Pois, se o silêncio é ouro, a história sem maquiagem e floreios é um diamante gotejado nos labirintos auriculares.