Como eu escrevo: linha de pensamento e metódica

Contém 13 estrofes.

1) Neutralidade é possível?

Procurei ver como autor

fica neutro no que escreve,

pois é claro: não se deve

ser, do Mundo, o professor.

Vendo ideias de escritor,

percebi sua prudência

para não deixar pendência

nem botar mais uma sobra.

Mas achei que toda obra

rodeia alguma tendência.

2) Cumplicidade autoral

Para escrever com isenção,

procurei diversas formas,

procedimentos e normas

de expressar a opinião.

Mas não achei exceção

de cúmplice na autoria.

De toda obra que eu lia,

olhava a síntese biográfica:

até um livro de Kafka¹,

com o próprio Autor, parecia.

¹ Ver: http://pensador.uol.com.br/autor/franz_kafka/

3) Preciosidade conclusiva

Conclusão é uma peça muito cara —

no trabalho do curso acadêmico,

no combate a um surto endêmico,

no plantio regado da seara;

na viagem que faz o pau-de-arara,

na escora segura do espeto;

no palpite de sorte do amuleto

e do jogo de azar, que nem se fala;

é na aula que o mestre dá na sala

e na "chave de ouro" do soneto.

4) Uma oficina, três conjuntos

ou: Oficina poética harmoniosa

ou: Linha de montagem poética

Faço a montagem do verso

na linha da poesia.

Do torto, faço o inverso,

dando métrica e harmonia.

Desse “conjunto-universo”¹,

sai uma equação² que cria

“conjunto-verdade”³ imerso

em teorema e teoria

ou “conjunto controverso”

que anima a Filosofia.

E o poema que eu disperso

não fere nem desafia.

¹ ² ³ Termos emprestados da linguagem matemática (teoria de conjuntos).

(Vai para postagem Quem sou - imagem poética.)

5) Brincadeira de poeta

Quem me conhece já sabe:

com papel, sou um tanto louco —

rápido e escrevendo um pouco

da estrofe que não se acabe!

Receia que eu desabe

do alto de uma ladeira

ou por cima da cadeira

com uma caneta na mão

e outra, caindo no chão,

"cada qual a mais ligeira!".

6) Dilema verbal

Não escrevo como falo,

porque é relaxamento.

E não falo como escrevo,

porque assim me ostento.

7) Parodiando Heráclito

A arte da Criação

tem o seu único momento:

não faço a mesma versão

do mesmo texto que invento.

8) Silêncio produtivo

É durante o silêncio que achamos

o maior rendimento no estudo.

Uma escrita de melhor conteúdo

sai também quando nos silenciamos.

Estudando, escrevendo, fabricamos

"diferentes produtos" ou achados —

que, talvez, não se encontrem nos mercados,

mas têm marca da nossa persistência,

com uma nova lição e mais fluência,

a serviço de alguns aprendizados.

9) Autoria responsável

Como pretenso escritor,

eu também passo a dizer

o que já disse outro autor,

como bem eu entender,

sem ter de ser seguidor

da sua obra, seu teor —,

e sim, do que eu defender.

10)

Mas, também, por outro lado,

eu tenho de observar,

do autor referenciado,

tudo que eu interpretar.

É porque sua ciência

junta-se à experiência

para me orientar.

11) Conclusivo

Como escritor e poeta,

procuro incessantemente

o verso ou frase completa,

para o que meu peito sente;

falando em sono ou dieta,

dou a volta e faço a reta

de uma norma concludente.

12) Sob pressão: sonho e controvérsia

Não é pela inspiração,

como fazem outros vates,

que eu escrevo meus quilates

ou peças de criação.

Escrevo sob pressão,

por motivos variados:

"de sonhos realizados

à realidade perversa";

da matéria controversa

aos temas pacificados.

13) Por exemplo, sobre um hospitalizado

Que dizer do internamento

na clínica, no hospital,

após o Clínico Geral

prescrever medicamento?

"no leito do esquecimento",

sem medicação suprida?

sem assistência devida?

Deixa enfermo em desespero

a pensar no exagero

de estar "sepultado em vida"!