Tédio

Vendo uma criança mimada

envolta em presentes largados,

quer tudo, não se esforça em nada,

não valoriza o que lhe é dado.

A sobrinha da minha amada,

menina enérgica e afoita,

esperneava desesperada:

"Quero fazer alguma coisa!"

Viver na diversão sem fim?

Seria bom se isso existisse.

O corpo se acostuma enfim,

perde o prazer, vem a mesmice.

Acostumada a escutar "sim"

em permissividade doida,

ela volta a gritar assim:

"Quero fazer alguma coisa!"

A pulseira nem sente mais,

já esqueceu que está no pulso.

O prazer que o doce lhe traz

não é tão grande no segundo.

Todo o prazer logo se esvai,

mas a dor de viver lhe açoita.

Somente o tédio não lhe trai:

"Quero fazer alguma coisa!"

Folha de papel sem escrita,

vivendo a todo instante afoita

em preencher o vazio da vida:

"Quero fazer alguma coisa!"