A PORTA


Da porta da frente recebo a visita e o carteiro.
Da porta de trás vejo silencioso o pôr do sol.
Da porta da frente despacho os meros resíduos caseiros.
Da porta de trás contemplo calmamente a noite fotografada.
Da porta da frente vem boletos pra gente.
Da porta de trás miro o morro escurecendo,
mulheres findando seu dia, varrendo, cozinhando.
Escuto rumores de atritos entre casais.
Da porta da frente vejo gente de toda natureza,
negros, brancos, mocinhas seminuas, magros, gordos e
mascarados de 2020.
Da porta de trás sinto o vento frio de boa noite.
Tocam-me famintos e esqueléticos seres hematófagos
buscando alimentar-se do sangue da gente.
Da porta da frente vigio a rua, vejo crianças e meninos ficarem moços
empinando pipas.
Vejo velhos sentados esperando o fim dos dias.
Vejo pombas e bem-ti-vis, da porta da frente.
Da porta da frente recebo a aurora.
Da porta de trás o crepúsculo me engana ligeiramente.
Pela porta da frente alucinados seres entram e saem iluminados.
Pela porta da frente noivos entram, saem casados e felizes.
Pela porta da frente entram os enfermos esperançosos.
Pela porta de trás saem corpos pra mãe terra receber.
Os vivos entram e saem pela porta da frente para guardar entes queridos.
No céu pela porta estreita
Deus a espera, porque lá, não tem porta dos fundos.

WALTER BERG
Enviado por WALTER BERG em 01/07/2020
Reeditado em 18/02/2024
Código do texto: T6992953
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