CANSAÇO
Há em mim um certo cansaço.
Não me refiro ao cansaço
dos ossos,
músculos
pele,
nem ao do viço que passa como a brisa.
Há em mim
Um certo cansaço em neblina
que me perpassa o peito.
É como se o fôlego
dos tempos
resfolegasse seco de sopro
a poesia que falta
na paisagem do cotidiano.
Falta em mim
o ânimo das flores lá de fora
que afloram sem pressa nem tempo
cada uma no seu lugar
de missão e de direito.
Aquele florescer natural que nada o segura.
Há em mim a saudade do sentir...
ao se tocar todas as texturas
suaves que despertam no frescor das auroras
arrefecidas pelas gotículas dos orvalhos
chorados das madrugadas silentes.
Falta em mim
A graça do passarinho ingênuo
que vê graça e fantasia quando
beberica os pingos d'água pendentes
nos cálices das folhas das varandas
a esmo da vida que goteja...
A piar o prazer por mais um sol que ilumina o dia.
Há em mim um certo cansaço
do mesmo argumento ilógico e vociferado
que já não me convence de nada.
Cansaço! Cansaço!
O de enxergar toda a velhacaria
transfigurada em insanas mãos que doam
o tudo já retirado das esperanças.
É Cansaço que transpassa o peito.
O de sentir o vento soprar
um sopro roubado
a me tocar sobre nós
o burburinho mudo
da natureza alheia
ora rude, ora delicada
que passa sem contar
e sem saber os porquês...
Numa sequência
de sentidos e vistos cansaços,
há em mim todos os prolapsos
das dores que nunca sano
no mesmo diagnóstico
de cansaço meu no meu outro igual.
Não...não...
Eu não me refiro à força
da matéria que cede sem sopro
aos esforços conquistados a pulso.
É o cansaço,embora pulsante
de saber
que o todo corre a revelia
dos sentidos.
O cansaço dum reamanhecer que espera
por acontecer abrilhantado...
Num horizonte tangível de verdade.