Velho Januário
Januário de poucas palavras vivia.
De poucas lembranças se vangloriava.
De poucas mulheres sofria.
De poucas tristezas chorava.
O sertão seco era terrível.
A água era o ouro que rezava.
A fome era seu rosto horrível.
A seca era sua maior asa.
Mas nem de tristezas sua vida existiu.
Das poucas lembranças que guardou.
Uma somente resistiu.
Aos sorrisos daquele velho capinador.
Rico por um dia ficou.
Quando seu filho que mais amou.
Ao seu velho pai presenteou.
Em conhecer o mundo que nunca sonhou.
Seu filho do mundo conhecia tudo.
Mas ainda não conhecia as lágrimas de seu pai.
Que caíram exatamente no mesmo segundo.
Que ele disse “onde o senhor vai?”
Nem quis saber o velho Januário.
Se nadar ele não sabia.
Na areia só se via a velha figura.
Daquele velho que corria.
No mar conheceu o frio.
No mar conheceu o sal.
No mar ele virou criança.
No mar ele esqueceu do mal.
Que na sua terra ficou.
Que na sua imagem grudou.
O semblante do velho Januário.
Que o povo sempre lembrou.
Na volta de suas memórias a cadeira balança.
Contando aos netos como era Cancún.
De como por um dia ele virou criança.
De como na beira do mar ele era só mais um.
Velho Januário pouco sorria.
Mas sabia como ninguém se expressar.
Sabia que lembrando daquele dia.
Um herói do sertão veio a se tornar.