Hoje não

Entrou no carro e não ligou o rádio.

Não quis fazer o que era de costume, não quis.

Só por hoje tentou não ouvir nada.

Tentou prestar atenção no som que vinha lá de dentro.

Não ouviu.

O silêncio era tamanho que criou vida, entraram num diálogo sem fim.

Hoje não quis fazer o que fazia todos os dias, não quis.

Guardou a monotonia em uma sacola, saltou de um prédio e, sem para-quedas, mergulhou fundo na vida.

Lembrou dos sonhos que já não tinha, dos amigos e da família.

Lembrou que estava só.

E agora por si só, caminhava com as próprias pernas.

E como era cômodo o incômodo que esse contínuo causava.

Mas continuava, continuava sempre a se repetir.