SOMBRAS

No meio da multidão sou o ninguém que ninguém procura,

a sombra do corpo que passa sem ver a sombra de sua loucura,

misturado ao tudo que é nada sem escritura ou decisão de posse,

assombro e mistério, nenhum ruído, sombra não tem tosse...

Vago entre mil sombras que se escondem em si mesmas,

tomo a forma de outra e outra e outra e mais outra

como fosse folha pálida sem nome dentro de uma resma,

sombra esquálida que dança dentro do corpo de uma louca...

A existência de uma sombra se cumpre com o ritual do sol quente,

que nasce excelso, lindo, magnífico, circunspecto a quem não o vê,

invade o lado esquerdo e a sombra se protege à direita, urgente,

projeta imagens sem conteúdo mas que só existem a quem crê...

Morto o sol pela espada da noite, morrem todas as sombras,

só a elétrica luz da criação humana traz espíritos de sombras vivas,

que se vão quando a última noite, antes do sono, a terra toma

e a envolve em seu escuro manto e a leva à sua casa cíclica...