HOJE QUE A TARDE É CALMA E O CÉU TRANQUILO?

                                                         FERNANDO PESSOA


Hoje que a tarde é calma e o céu tranquilo,
E a noite chega sem que eu saiba bem,
Quero considerar-me e ver aquilo
Que sou, e o que sou o que é que tem.

 
 
 
Olho por todo o meu passado e vejo
Que fui quem foi aquilo em torno meu,
Salvo o que é vago e incógnito desejo
De ser eu mesmo que meu ser me deu.




Como páginas já relidas, vergo
Minha atenção sobre quem fui de mim,
E nada de verdade em mim albergo
Salvo uma ânsia sem princípio ou fim.
 
 
Como alguém distraído na viagem,
Segui por dois caminhos par a par.
Fui com o mundo, parte da paisagem;
Comigo fui, sem ver nem recordar.




Chegado aqui, onde hoje estou, conheço
Que sou diverso no que informe estou.
No meu próprio caminho me atravesso.
Não conheço quem fui no que hoje sou.


 
 

 
 
 
Serei eu, por que nada é impossível,
Vários trazidos de outros mundos, e
No mesmo ponto espacial sensível
Que sou eu, sendo eu por ´star aqui?

 
 
 

Serei eu, por que todo o pensamento
Podendo conceber, bem pode ser,
Um dilatado e múrmuro momento.
De tempos-seres de quem sou o viver?

 
 
 
 
(Obra Poética de FERNANDO PESSOA)
 

 
Sou muito fã das Poesias de Fernando Pessoa e também de seus heteronônimos ( Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Bernardo Soares e Ricardo Reis) Ele descreveu magistralmente e como ninguém, pensamentos, sentimentos, sensações, questionamentos de todas as pessoas, até das que não o sabem como dizer.


Eu busquei inspiração nele, e principalmente na obra acima, para compor o soneto abaixo:
 
 



HOJE A TARDE É CHUVOSA E O CÉU CINZENTO

Hoje a tarde é chuvosa e o céu cinzento
Penso no que teria sido de mim
Se eu não mudasse aquele pensamento
Ela só pensava em suicídio sim

Foi um tempo em tenebroso tormento
Parecia que o mundo chegava ao fim
Quando chegava angústia do momento
Se hoje aqui estou devo à outra em mim

À que pela vida é enamorada
Que gosta de saudar todas as cores
E louva cada hora abençoada

Àquela que só pensava nas dores
Acabou terminando sepultada
com o despertar dos novos amores

 
 
Madalena de Jesus