Insomnia

Eu me deito para dormir

Mas descanso não me convém

Rodo o mundo, sem da cama sair

Enquanto doce sono nunca vem

Preso entre aqueles acordados

De minha mente sou refém

Entre os perdidos e extraviados

Perambulando nesta selva escura

Na estrada certa não encontrados

Mas numa selvagem, áspera e dura

Sendo tão fraco ou tão forte

Em aturar tamanha penura

Pois ainda mais amargo que a morte

É o terrível liso e amplo caminho

E quão triste a felicidade e sorte

Daqueles que não sentem o espinho

Acostumados em sua turba turbulenta

Onde melhor é ter de andar sozinho

E a tentação que nos alimenta

A benção que natureza uniu

De buscar o que nos sustenta

E desejar o que nos é sadio

De temer o que nos faz mal

E evitar tudo aquilo que é vil

A bússula do homem e animal

O guia que é em nós nativo

Um bom instinto pré-racional

Que à felicidade tem dirigido

Que nos move contra o tédio

E à todo bem é conducivo

Mas não é amargo um remédio?

Mesmo sendo bom e ameno

E não é doce guloseima um assédio?

Ao invés nos é doença e veneno

Como então o certo eu saberei?

Pois o guia de prazer e dor eu condeno

Assim a conhecida via abandonei

Sem conhecer a verdade ou virtude

E na racional razão eu procurei

O que real é e o que apenas ilude

O que melhor guia a humanidade

À mais boa e vera plenitude

Eu giro na cama em ansiedade

Toda distração apenas paliativa

O instinto de aversão e vontade

Mais causa dor que mitiga

E a óbvia mancha na superfície

Um mal muito pior nos avisa

E tratar os sintomas é tolice

Ao invés de curar a causa plana

Por mais que alívio se cobice

É da fonte que a impureza emana

A poluição qual túrbido torna

O inteiro córrego da vida humana

Fria ou quente, mas nunca morna

A pesada noite paira penosamente

O pensamento que minha mente adorna

Soa sua cacofonia eloquentemente

O dia parece que nunca vai voltar

Até que ele retorna de repente

E queria eu tanto escultar

A glucófona voz do bom sono

Ou que viesse me atormentar

Uma madrugada infestada de sonho

Mas terrível silêncio vem rugir

E na vazia noite eu me abandono

[E às vezes me faz sorrir

Contemplar tal vil vicissitude

Os reais terrores ouvir

Ou abraçar a ilusão que ajude

Apenas esperando com nada à sentir

Até a última hora de quietude]

Bedengus
Enviado por Bedengus em 18/12/2024
Código do texto: T8222213
Classificação de conteúdo: seguro