Razão
Escrevo o poema para esquecer da fulana pérfida
e que a Inês é morta.
Escrevo o poema para confirmar
que a vida é torta.
Escrevo o poema para lembrar das corridas
tristes e soltas no Campo de Santana.
E minhas pernas, tristezas e as correntes já não são as mesmas.
Escrevo o poema para confirmar que as contas
que chegam neste mês são azuis e também nos outros.
Escrevo o poema para fugir da mesmice lamurienta das ruas feias
daqui deste lado de Pátmos (onde degredo)
e escrevo um último evangelho.
Escrevo o poema para receber o que é velho.
Escrevo o poema para lembrar que meus pais estão mortos
e o meu nome já não cabe?
Escrevo o poema antes que o açúcar acabe.
Escrevo o poema porque Helena não tem nada com isso.
Escrevo o poema porque gosto de ouvir Mozart.
Para lembrar que o ontem se gastou, escrevo o poema.
O poema é inútil hoje ainda mais com as bombas caindo no Oriente,
as eleições nos estados unidos
(letras minúsculas mesmo, o poema não carece correções)
e a desunião das famílias.
Mas por alguma razão o poema existe,
famélico.