A OLHO NU
Saiba
que há pedregulho
e há espinhos
e lixo na sarjeta
e a lama inesperada.
Há o que é contrário,
o que impede,
o que desfaz.
Há ervas daninhas,
impurezas insuspeitadas
em águas
e em almas.
Veja. Ouça.
Há duplas palavras
a emanar
de duplas faces,
segredos de vário vulto
e longo alcance.
Há a bofetada,
que chega meio de surpresa.
Há o que você jamais suspeitaria
no armário de quem você jamais imaginaria.
Há o lado escuro da lua
e a sombra da vida.
Mas há também
o que você pode dizer
à sua imagem no espelho
dia após dia.
Porque há um límpido riacho,
em algum lugar,
a murmurar sobre o duro pedregulho;
e a rosa perfumada
não é menos generosa
por causa do espinho;
e palavras e pensamentos
são qual poeira ao vento.
E a qualquer momento
a lama na sarjeta
será como uma velha notícia,
varrida pela pródiga chuva.
E a sombra do caminho,
sem nem perceber,
entregará seu negrume
à carícia do sol.
Pois então?
Por qual fresta,
no granito do seu ser,
passará a necessária luz?