Bike no asfalto
Andando de bike no asfalto,
Olhando pessoas distraídas,
Perdidas em pensamentos soltos,
Sem sorrisos em seus rostos,
Ouço música dos anos 80 nos fones,
Vendo cidades decadentes,
Vidros espelhados brotando na estética,
Arquitetura de poder e domínio,
Concreto e aço contorcendo-se,
Pixações e cartazes nas paredes,
Passos rápidos jogando o jogo,
A busca por sobreviver mais um dia,
Trabalhando arduamente de 8h às 20h,
Em troca de 15 min de almoço,
E um salário miserável no início do mês,
A dignificante escalada do ser humano,
Construindo a riqueza de outros,
Acreditando que será "um igual",
Em uma terra de desigualdades,
Para viver no fundo do poço,
Onde o ter vale sempre mais do que ser,
O frenesi capitalista e utilitarista,
Seres são trocados por 30 moedas,
Aplicadas em ações na bolsa de valores,
Pedalo mais rápido em curvas velozes,
Carros disputam modelos e preços,
Ônibus abarrotados de operários,
Força motriz cansada de arranha céus,
Indo para casa de estômago roncando,
Almejando um futuro diferente aos filhos,
Que jogam bola de gude no descampado,
Que matam as aulas da escola,
Que namoram às escondidas,
Engravidando aos 15 anos,
Encerrando ali os sonhos dos pais,
Repetindo o ciclo de encarceramento,
Mais operários para a carvoaria,
Mais proletários para a exploração,
Sem sabedoria política ou cultural,
Alienados lotando igrejas evangélicas,
Esperando a salvação dos céus,
O paraíso no pós mortem,
Enquanto seguem na vida como gado,
Em filas nas rodoviárias urbanas,
Contando os centavos nas passagens,
Espiando pela janela os conversíveis,
As lojas da Gutti e Dolce Gabanna,
As perfumarias parisienses,
Os restaurantes com chefs Michellin,
Os hotéis internacionais cinco estrelas,
Pontilhando na Av. Paulista,
No céu púrpura do entardecer,
Meus pés têm as asas de Mercúrio,
Giro o tempo, a roda do destino,
Escrevi minha própria rota,
Escapei ao moedor de homens,
Faço a minha narrativa, a minha escolha,
Sigo meu próprio mapa,
Não sou operário e nem nobreza,
Sou um andarilho observando,
Anotando mentalmente os fatos,
Registrando nomes, cores e percursos,
Poetizo cada instante visto e sentido,
Pedalando nas trilhas da consciência...