A vó
A vó de um amigo meu, a Dona Silvina
Morreu em uma tarde de segunda-feira.
Fumava um cigarro atrás do outro
E ouvia seu radiozinho na cozinha.
De certo que gritava com um neto,
Espantava um gato que pulou o muro.
Pegava da carteira outro cigarro
E balançava-o no ar com esperteza.
Ela era tão magrinha! Nunca a vi
Mas sei que ela era magrinha
E com o vestido cor-de-rosa
Esperava a janta para deitar-se.
Acordava nas madrugadas frias
Para pitar e lembrar dos dias
Em que era nova, e esquecida
Passa a imaginar cenas da vida.
Via-se bela a dançar nos salões
De um interior pouco conhecido
E os moços, jovens e senhores
Disputavam no baile a sua mão.
Olhava-se no espelho de seu quarto
E via seus cabelos morenos e viçosos
Que corriam por seus ombros magros
Em cachos invejáveis a qualquer amiga.
Dançava a canção sempre faceira
Longe de casa e longe dos parentes
Que mantinham nela olhos certeiros
Para assegurar-lhe a casta decência.
“Hás de casar um dia, minha senhora
Com um moço bom e respeitoso
E hás de ter filhos e muita alegria
Com tua família rica e abençoada!”
O padre dizia, e hoje, nem isso
Ela lembrava mais, pois está velha;
Só os netos e os filhos lhe acercam
E faziam festas e junções aos domingos.
E morreu assim, quem sabe tranquila
De ver que tudo não foi em vão
Sempre decidida em ter em seus dias
Os antigos valores da vida d’então.