Um charco

Há tempos tão despovoados e profundos

vilas tortas, desertos quentes, ventos sibilantes

que em mim desata o pranto persistente

a regar em chuva o algodão do peito.

sou charco de lembranças, insistências,

malfadadas histórias, tramas desmanchadas

e a constância de uma ausência gritante,

terreno baldio, cemitério de covas abertas.

Há tempos tão despovoados e profundos

que sou feito um latifúndio vencido pela geada.

não encontro nenhuma vigarice em mim

disposta a queimar-me na fogueira das bruxas.

pois sou - já disse - um charco

não queimo. esfrio e molho.

para que em mim, naufraguem

algumas de minhas saudades.