Silêncio

Se paramos,

Se silenciamos,

Ouvimos a voz,

Aquela tosse que sufocamos,

As palavras que nos contestam,

Os sons de outros tempos,

Os sussurros de outras vozes,

As perguntas que não fizemos,

As respostas que não encontramos,

As razões das desrazões do coração,

Os desatinos das ilusões decepcionadas,

As lágrimas não derramadas antes,

Os passos solitários à beira do abismo,

O vento que sopra do outro continente,

A maresia que assobia nas ondas do mar,

O canto do Corvo na janela após a chuva,

O conto do solitário no café da esquina,

O bater de asas da borboleta no bosque,

O que escondemos de nós mesmos,

O que segredamos em sonhos distantes,

O que esperançamos anestesiados,

O que clamamos angustiados na dor,

Ouvimos os lamentos de nosso passado,

Ouvimos as esperanças do futuro,

Ouvimos nossa própria solidão,

Ouvimos nossa densa imensidão,

Nossa voz perdida em várias memórias,

As outras vozes, barulhos de pessoas vãs,

Deixam os sentidos se esvairem no tempo,

As mensagens são mudas, estão em libras,

Deslocamos nossa atenção, nosso olhar,

O silêncio é tudo o que existe e sentimos,

É o que nos significa, nos define e continua,

É o que somos, nosso castelo de espelhos,

Tudo o que nos identifica e revela,

O que há por dentro das muitas camadas,

O que traz a sanidade em meio ao caos,

O que nos rabisca um caminho no mapa,

O que nos pinta uma jornada no horizonte,

Aquarela de cores e expressões de vida,

Noturno luto de mortes não anunciadas,

Ah, o silêncio que é o tudo e é o nada,

É o que somos, de onde viemos e vivemos,

Endereço para onde voltaremos,

Trilho do trem sem um destino previsto,

Rota inscrita no bilhete do destino,

Seguimos somente o ouvindo em nós,

Ouvindo o som sem ruídos em nós,

A música sem letras e melodias em nós,

Apenas o silêncio, o vazio que preenche...