Eis-me aqui

Eis-me aqui.

Nossos versos colidem,

nossa boca diverge,

guerras e sangue estampados

no peito de quem não compreende

o valor das medalhas,

o mérito de ter mérito

pelos corpos empilhados além,

pelos corpos abortados aquém.

Revoluções.

Evolução?

Eis-me aqui.

Nossos filhos se perdem

diante de nossos pais,

filosofias esfarrapadas,

ideologias acorrentadas,

prazeres vis perpetuados na carne

que, por entre becos, se desfazem

entre orvalho, sirenes e urina.

Penumbra.

Espectro.

Eis-me aqui.

A hora cansada que exibe

meu corpo cansado que exibe

a máscara ao chão, antes de tudo,

a própria natureza que reclama,

aos prantos, tamanha ausência de natureza.

Meus irmãos,

olhei através da noite e estávamos lá,

entregues, famintos, zumbis,

folia certa de quem ri os horrores

dos que morrem por algum punhado

de sorriso, de atenção,

de luz que ilumine o caminho

nevoento de tantos aprisionados

à escuridão do esquecimento.

Lágrima certa que balbucia em mim

a vida incerta dos que já não se dão conta...

Ah, Senhor,

se é certo que És a própria vida (e és!),

se é certo que tens todo o Poder (e tens!),

ainda que minha fé vacile,

ainda que eles estejam cientes da morte,

ainda que tamanha certeza do luto

seja a voz do noticiário inebriado de amanhã,

ouve a oração deste rapaz,

preenche o vazio desses tais,

olha para esses pequeninos

e nos faz irmãos outra vez

diante da Tua Face, pela majestade da Tua Glória.

E que ao findar do último suspiro,

sim, a batida derradeira do coração que por teus

preceitos deseja viver,

lembra que somos homens,

semelhança da tua beleza

que por rebeldia se preferiu

à moldura de perdição e desobediência,

lembra que somos pó,

pequenos demais,

fracos demais,

lacrimosa poesia que a Ti encanta

a cada vez que um lábio aflito te relembrar:

Eis-me aqui!

Marcos Karan
Enviado por Marcos Karan em 02/02/2024
Código do texto: T7990516
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