MONÓLOGO EM DÓ MAIOR
[no New York Botanical Garden]
São dez horas da manhã.
Estou em paz
comigo
com o dia
com a vida.
Os rododendros
abrem seu sorriso carmim,
que é para todos
— eu sei —
mas que hoje
é especialmente para mim.
Um cheiro de grama
recém-cortada
mistura-se a outros
cuja origem não sei
nem me importa saber.
Mas gosto de saber
que o perfume das gardênias
me espera,
repousando
em seu branco imaculado.
Olho com carinho
as peônias
calmamente belas
agora em sua meia-idade
mas sem nenhuma saudade
do fulgor da juventude.
Rosas. Rosas. Rosas.
Exuberantes.
Generosas.
Mas tão humildes
em seu esplendor,
que parecem ouvir
o sussurro íntimo
da minha gratidão,
tão ínfima
diante de tanta realeza,
mas igualmente bela
por ser tão sincera.
De repente,
acho-me frente-a-frente
com um arco-íris:
o arco caleidoscópico
das íris.
Secretas.
Aristocráticas.
Guardiãs de um mistério
fragrante e sem nome,
que a cada ano
busco decifrar,
mas a cada ano
sou obrigado a partir
derrotado mas feliz.
Pois levo comigo
o mistério aberto
e a promessa de outros anos
e outras tentativas.
À minha volta,
a natureza é um único cântico.
Vento. Sol.
Folha. Raiz.
A beleza pródiga,
a felicidade por um triz.
Estou em paz
comigo
com a voluta do tempo
com o que a árvore
me diz.