MONÓLOGO EM DÓ MAIOR

[no New York Botanical Garden]

 

São dez horas da manhã.

Estou em paz

comigo

com o dia

com a vida.

 

Os rododendros

abrem seu sorriso carmim,

que é para todos

— eu sei —

mas que hoje

é especialmente para mim.

 

Um cheiro de grama

recém-cortada

mistura-se a outros

cuja origem não sei

nem me importa saber.

 

Mas gosto de saber

que o perfume das gardênias

me espera,

repousando

em seu branco imaculado.

 

Olho com carinho

as peônias

calmamente belas

agora em sua meia-idade

mas sem nenhuma saudade

do fulgor da juventude.

 

Rosas. Rosas. Rosas.

Exuberantes.

Generosas.

Mas tão humildes

em seu esplendor,

que parecem ouvir

o sussurro íntimo

da minha gratidão,

tão ínfima

diante de tanta realeza,

mas igualmente bela

por ser tão sincera.

 

De repente,

acho-me frente-a-frente

com um arco-íris:

o arco caleidoscópico

das íris.

Secretas.

Aristocráticas.

Guardiãs de um mistério

fragrante e sem nome,

que a cada ano

busco decifrar,

mas a cada ano

sou obrigado a partir

derrotado mas feliz.

Pois levo comigo

o mistério aberto

e a promessa de outros anos

e outras tentativas.

 

À minha volta,

a natureza é um único cântico.

Vento. Sol.

Folha. Raiz.

A beleza pródiga,

a felicidade por um triz.

 

Estou em paz

comigo

com a voluta do tempo

com o que a árvore

me diz.

 

James Melo
Enviado por James Melo em 01/02/2024
Código do texto: T7990044
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