Uma vítima do próprio desprezo.
Desassociado do que me cerca
Enxergo-me em terceira pessoa
Ali, sentado, digitando
Bocejando mais vezes do que o necessário
Pensando em coisas que não são completamente reais
Mas que não fogem tanto do campo do possível
Ações repetidas, frases autografadas
Um homem de muitos talentos,
Alguns bons,
Muitos outros que não valem nada
Apenas uma amálgama de justificativas
Que variam das biológicas
Às corrompidas;
Que drena de si o mesmo que drena do entorno,
Que exige muito com pouco retorno;
Que poderia morrer a qualquer instante.
Que se envenena, se machuca
Arranca os olhos pois já não escuta
Qualquer palavra que antes saia aos montes de seus lábios
Um rápido declínio, uma montanha pavorosa
Contendo todos os espinhos de uma rosa
Mesmo sem oferecer o que polinizar.
O que entristece - e não se apresse em entender
É que a mesma vontade que governa tudo
Também desgoverna a motivação
De ser alguém melhor.
De ser alguém maior do que a própria sombra
De quebrar os limites desta carne,
E transcender no mesmo lugar.
Uma mudança de personagem,
Não do cenário
Pois este já vem completo
Já carrega o que muitos pediriam para si
Mas que não é suficiente para mim.
Quando meus gritos finalmente atravessam
A barreira que separa a mim de mim mesmo
Meus sussurros atingem meu próprio ouvido
E tentam me alertar de coisas que apenas nós podemos ver
Que apenas nós poderíamos resolver,
Mas, sem qualquer resposta, fica evidente:
Eu não me escuto mais.
Eu não me vejo mais.
Eu não me penso mais.
Perdido, fora do meu lar,
Vagueando pelo imaterial
Sozinho, sem meu igual
Descobrindo por conta própria
Que nosso maior inimigo
É outro de nós
Que também vagueira pelo imaterial,
Caçando seu igual,
Acertando contas com teus próprios,
Teus maiores inimigos:
A consciência que tão desesperadamente corre
E um estático corpo físico.
No fim da caçada,
Quando já perdi boa parte do que me compõe
Vejo os restos mortais de outros como eu
Desassociados, executados
Pela mesma besta que me caçou.
E tudo fez sentido.
Fui apenas um, de muitos outros
Era o último que restou
Ou um dos muitos poucos que ainda existem.
Um descarte imediato quando aborreci,
Quando tentei a evolução e falhei.
Quando me tornei um incômodo.
A última imagem que vejo
Enquanto descanso
Sou eu, sentado
Definhando.