vivo
chorei pela sarjeta
chorei pela violência
chorei pelo abandono
chorei pelo absurdo
chorei pelos latidos que nos adormecem
chorei pelos dias que não ignoramos
chorei pelas chuvas que fugimos
chorei pelas palavras que perdemos
chorei pelos sóis que explodiram
chorei pelos amores extintos
chorei pelas camas destruídas
chorei pelas refeições no lixo
chorei pelas poças evaporadas
chorei pelos pais que se mataram
chorei pelas mães que passam fome
chorei depois de ver as lágrimas de um deus
escorrendo pela janela
chorei depois de ver os vasos de plantas caídos
no chão
chorei depois de ver meu reflexo recém saído
da escuridão
que adormeci
na última década
chorei porque não consegui dormir na noite anterior
chorei porque dentro de mim há muita dor
que nunca verá a luz do dia
chorei porque todos nós somos egoístas
e todos nós precisamos chorar a ajuda
que negamos de nós mesmos
chorei porque ainda estou vivo,
mesmo sem ainda saber o que devo fazer
com tudo isso.