Imortalizada
Uma certa moça, na flor da idade
Na casa dos vinte anos
Chegou para um mecenas e disse
“Torne-me uma deusa, torne-me imortal”
“Crie uma arte minha, antes de ir embora desta vida”
“Uma arte minha que poderá sobreviver ao tempo”
“E a qualquer tipo de intempérie”
“Seja ela calor, luz, chuva, raios, terra, vento, cortes”
“Somente assim poderei conhecer várias pessoas depois de sumir”
“Só assim as pessoas irão me conhecer e me lembrar de mim depois do meu partir”
O mecenas atendeu o desejo de sua cliente
Criou uma arte fiel dela
Capturou suas belezas e qualidades
Juntamente com seus defeitos e demônios
E a expôs em praça pública
Todos a viram, suas mais detalhadas características
Gravaram bem aquela imagem
No entanto, a arte do mecenas não foi tão resiliente
À pedido da moça
Castigada pelo sol, queimada pelo fogo
Dissolvida pela chuva, arrebentada pelas tempestades
Cortada pelos mais diversos instrumentos manejados
Por mal-intencionadas mãos humanas
Os visualizadores da arte notaram sua presença
E decidiram por recriá-la, cada um deles
Alguns mudaram os cabelos
Outros mudaram os olhos
A cor da pele, as feições do rosto
Vários, porém, usaram de sua próprias emoções
Como filtro para suas recriações
Os mais felizes recriaram a arte com tons de amarelo
Embelezando-a com raios solares
Os mais tristes a recriaram com tons de cinza e azul
Colocando céus nublados, gotas de chuva
E até mesmo gotas de tristeza
Os mais apaixonados, a colocaram do lado de alguém
Os mais solitários, sempre sozinha e reclusa
Os mais jovens, com uma pele macia, fofa e preservada
Os mais velhos, com a pele murcha, cheia de rugas e sulcos
A moça viria a partir sabendo que conheceria todas as pessoas
Por meio de seu retrato
Só que ela não soube que seria conhecida por todos
Por meio de diferentes filtros, interpretações e cores diferentes
Cada uma com um sabor especial
Sendo criada e recriada ad eternum
Até o cérebro e o coração do homem
Serem varridos da existência