Lataria
Numa noite fria
Amparada pela lataria que lhe transporta
Você leva ambas as mãos ao rosto
Num claro sinal de desgosto
E reflexão tardia.
Você sequer sabia, mesmo que te gritassem;
Que arranhassem a lateral da sua cabeça
E as feridas infeccionassem com a verdade
Mesmo assim, com os sinais expostos
Com interlocutores dispostos a explicar
Com escritas vindouras do céu
E com sinais que vinham de baixo
Nada lhe faria entender, nada bastaria para compreender
A fatídica conclusão que agora te ocorre.
Sua bolsa vinha cheia de metáforas
E outras quinquilharias que garantiam estabilidade
Uma fundação rasa, baseada em inverdades
E outras passagens que garantiam o seu conforto.
Não te olho torto, pois também tive
Minha parcela justa de palpites errados
Vezes que as pernas foram menores que meus passos
E eternizei no asfalto a face do meu fracasso.
Vezes que eu cai e nunca levantei-me completamente
Feridas tratadas que insistem em abrir brevemente
E pulsar com a dor e sensação que eu poderia ter feito diferente.
Que minhas decisões erradas impediram as certas
Que os caminhos trilhados no inferno só existiram
Pois rejeitei todos os transportes que me subiam
E você, dentro da sua lataria, sentada em seu banco
Percebendo que escolheu o veículo
Que te manterá no mesmo plano.