Autocrítica
Das composições de cacofonia que saem da sua boca
Das teorias de muitos passos envoltas em beleza barroca
Da ventania que distorce as palavras, os enredos
Do breve apontar de dedos, mesmo que sem justa causa.
Dos adjetivos inferiores, dos dramas interiores
O eterno medo do que vai e não volta.
Duas mãos dadas que não se soltam
E outros cantos sobre dualidade.
A verdade sequer existe, é figurada
Pintada em tons de cores inexistentes
Que não enxergamos, que não conhecemos
Que sequer podemos criar.
Ela é subjetiva, sensível como carne viva
E muito suscetível a sangrar.
Um diamante bruto pendendo lapidar
Um ego gigante, minimizado, guardado numa caixa
Para não estragar.
Um orgulho, um preconceito
Todas as manias de um sujeito
Que fracassa em se achar
Em meio ao que já foi
Em meio ao que sabe que já existiu
Em meio a multidões que ninguém sabe se já viu
Mas que sabe que estava lá.
Em algum momento, em uma breve passagem
Ilusório e esquivo como uma miragem
Que traz uma gota de esperança
Para quem já vem feito e vestido de arrogância
A sede por si mesmo, saciar.
Minhas fontes secaram.
A fluidez natural não mais existe
Tornei-me sombra de minhas glórias
Que por serem poucas
Me fazem menor ainda.
Falo sobre conquistas, discorro sobre acontecidos
Com a tranquilidade que falo de um filme
E não memórias
Pois quem me representa ali não existe mais
Foi-se com o tempo, reduzido pelo distanciamento
Entre quem ele era e quem se tornou.
E o tornado com a certeza
De que jogará aos ares
Cada pedaço que restou.