ENCARNAÇÃO
Antes de eu nascer pedi ao sol
que consumisse minha alma
até que regressasse ao pó,
clamei ao cosmo em sua palma
que rareasse minha poeira
planeta por planeta
e apagasse a luz de cada estrela
pra não perseguirem meu rastro.
Implorei que mentissem meu paradeiro,
suspeitei, incontido, vindouro cativeiro,
de tudo quanto pude fugi do claustro.
Até que Deus, iracundo, me encontrou
e sequestrou todo meu esquecimento.
Fui ao ventre da mãe que me gestou
e desde então foi frio meu sofrimento,
a carne em constante decaimento,
a mente atulhando aborrecimento.
A dádiva é só boleto, a vida seca
é gana, grana, gozo, gula,
a alma, neste corpo, é dor intrusa,
aguarda o fim clemente da sentença
para o regresso ao justo olvidamento.