DOR FANTASMA
Em uma noite estrelada, um homem grita:
"Isso queima"
Seu cérebro o membro perdido não mais capacita
É uma memória, foi perdido todo um esquema
De ossos, de veias, de articulações, de musculatura
Foi perdida parte da armadura
E nas longas e desconfortáveis horas, o homem diz que se move o membro que se foi
Ele olha pro céu estrelado, respira fundo e se recompõe
Abre e fecha a prótese da mão, tentando se acostumar à substituta
Observa como os mecanismos são importantes nessa sua luta
Na superação da perda e na resistência em acreditar - tenaz -
Que - por mais que sinta - seu membro não se move mais
Sua prótese é forte e brilhante, engenharia de primeira, bênção do avanço tecnológico
Ele alcança com dificuldade uma rosa vermelha, fecha os novos dedos para pegar seus espinhos
Puxa de volta, observa analítico os detalhes da flor, sobe e desce o braço robótico
Estica novamente a mão para pegar sua taça de vinho
Desacostumado, ele quebra a taça entre os dedos e faz uma bagunça no chão
Ele coça a cabeça com a mão de carne e osso, limpando com ela a confusão
"Amanhã eu treino mais, agora vou para cama"
O membro perdido coça e queima como se tivesse encostado numa urtiga
Ele coça a prótese, esquecido, e deita na cama, amanhã terá muita tarefa temprana
"Vou tentar cozinhar, varrer, escrever, seguirei normalmente a minha vida"
Depois de um tempo pensativo, desliga a última luz da casa
Ele se conforma em ter perdido a mão dominante enfim, e dorme adormecendo junto a dor fantasma