Cendrado

A vida é tão cara,

Também é tão rara,

E tem gente que vive,

Como se não fosse morrer.

Aceite o seu destino,

Diante do absurdo.

Quero provar o orvalho,

Ouvir o que dizem as nascentes,

Sentir o contorno da água,

Pare!

Me deixe descer.

A terra que pinta meu pé,

Nela colhe quem semeia,

Areia na borda do rio,

Canta ao longe a cachoeira.

Um galo que pede café,

Vacas em lactação,

Napie cresce,

E para ele basta ser alimento.

A horta exige carinho,

Galinhas o milho e ração,

O campo quer ser aparado,

E o peixe,

Quer isca,

Anzol e puxão.

Casa Branca avarandada,

Lá tem lenha pro fogão,

Rede e espreguiçadeira,

E amor e proteção.

As crianças vivem livres,

Com respeito e educação,

Amizades são sinceras,

Tem boa pinga e causo bom.

Hoje a cachaça é nostalgia,

Cigarro espanta a solidão,

Plantaram prédios no asfalto,

Aqui irmão derruba irmão.

As grades são liberdade,

Valores em inversão,

Idolatrados bandidos,

Separados,

Queremos ser nação.

Todos vivem Alienados,

Não há horizonte,

Talvez em busca de Deus,

Cada vez mais alto é a construção,

Sobem um sobre o outro,

E arranham o céu com as mãos.

Sou réu confesso do "progresso",

Luto pela minha desolação,

Juntei-me ao que mais detesto,

Em busca de salvação.

É o limbo,

O fosso,

Um lago profundo.

Logo eu,

Que queria:

" Ter uma casinha branca de varanda

Um quintal e uma janela

Para ver o sol nascer".

Charles Alexandre
Enviado por Charles Alexandre em 09/05/2022
Reeditado em 23/04/2024
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