Racional, só coração de mãe

Quando era menino, queria ser astronauta

Só esqueci de combinar com a gravidade

Essa birrenta

Tentava e tentava e tentava

E não saia do lugar

Tens de manter os pés no chão, mamãe dizia

E o que mais posso fazer, pensava

Se o universo poda as asas de quem sonha demais

O tempo dilatou o desejo

Mas a vida contraiu o tempo

Minha constelação agora é a vizinhança

Meu telescópio são esses velhos óculos

Por onde enxergo o mundo que me cabe

O brilho que me sobra

A certeza que escorre

E teimo em não deixar ir

E o que mais posso fazer, pensava

Se tudo que sei é tentar voar

Há, certamente, algo de mágico nesse cosmos

Milhares de corpos celestes

Milhões de corpos sem norte

Vagando pela eternidade

Buscando pelo indecifrável

Clamando por uma razão absoluta

Como se, alguma vez, o acaso cedera a lógica

Racional, só coração de mãe

Que sequer pode conter

Os anseios afoitos de um menino

Decidido a embarcar nessa odisseia impossível

Em outra galáxia

Ou numa folha de papel

Ricardo Milek
Enviado por Ricardo Milek em 28/02/2022
Reeditado em 01/03/2022
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