AGORA HÁ POUCO

Esqueça das metafísicas

Elipses, flashbacks e profecias.

Esqueça das ciganas deitadas nas calçadas

E dos anciões incorporados nos barracões

Esqueça dos párocos que arrastam sermões

E dos búzios sujos de fantasias

Esqueça das cartas, dos signos, das estrelas e das pragas.

Esqueça do início e do final do caminho

Do oásis e da pedra no meio do caminho

Esqueça do caminho.

Tendes este exato segundo de morte celular

Em que no reino quântico as bactérias operam o milagre da finitude.

Tendes dois pulmões que tragam este segundo de prazer e azar

Esse segundo que já fora devorado pela compulsão de Cronos.

Tendes, pois, à revelia deste novo segundo, a possibilidade de não ser

Como toda diáspora que escrevi agora há pouco.

Tendes o sono e a raiva e o ódio e o rancor e o medo

Uma caixa de pandora que se abre na velocidade da luz de um segundo

Que já não tendes mais.

Tendes a luz para iluminar dois pés que deveriam permanecer como um par de árvores frondosas.

Ainda tendes pés.

De que servem os pés?

(Italo Samuel Ferreira Wyatt)

Italo Samuel Wyatt
Enviado por Italo Samuel Wyatt em 11/11/2021
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