MERGULHO EM MIM
SOU UM POÇO ESCURO
AS VEZES DEIXO A LUZ ENTRAR
MAS NO ESCURO FICO MELHOR
NÃO É UM ESCURO DE DOR
É DE CRIAÇÃO
UMA ESTUFA QUE PERMITE GERMINAR
SEMENTES QUE AINDA NÃO SABEM DA LUZ
ELAS PRECISAM DESSE TEMPO
ALGUMAS CRESCEM E VIRAM ÁRVORES LINDAS
OUTRAS MORREM NO ESCURO
SÃO SEMENTES DE AMOR
DE ARTE
DE TRABALHO
DE VIDA
DE MORTE
AQUI FORA TUDO É MUITO REAL
DENTRO DO ESCURO DE MIM
O PALPÁVEL É SUTIL
LEVE COMO O NADA
FORTE COMO A VIDA
INCRÉDULO COMO UM ATEU
CRÉDULO COMO UMA FILHA DE MARIA
OU DE YEMANJÁ
TRAGO DENTRO DE MIM
A VERGONHA DO BRANCO QUE ESCRAVIZOU
A DOR DO NEGRO QUE FOI ESCRAVIZADO
A CERTEZA DE DEUS
TODAS AS DÚVIDAS SOBRE O DEUS QUE É VENDIDO HÁ SÉCULOS
DENTRO DE MIM TEM
MUITOS CANTINHOS
UNS CHEIO DE MEMÓRIAS DE CRIANÇA
OUTROS COM CHEIRO DE BORDES
SALAS SOFISTICADAS RELUZENTES COMO OURO
SALAS DE SOPAPO, COM CHEIRO DE BARRO E MATO
TENHO UMA SALA DE MAR
OUTRA DE RIO
UMA QUE É SÓ CAMINHO
MAS A QUE ME DEIXO ESQUECER DO TEMPO
É A MINHA SALA DE MÚSICA
HÁ TAMBÉM UM TEATRO COMO ERA O ARCÁDIA
TENHO TAMBÉM UM MURO, LÁ NO FUNDO
ONDE GOSTO DE NAMORAR
TENHO UM CANTINHO COM UMA MESA E CADEIRA
ONDE SENTO E ESCREVO ATÉ CANSAR
UMA REDE COR DE TERRA
ONDE LEIO ATÉ DORMIR
TENHO UM LUGAR, ONDE FICA UM OLHO A PASSAR
ELE É O QUE ME GUIA PARA A LUZ
NÃO ME DEIXA PERDER A DIREÇÃO
DOS SENTIMENTOS
DA CRIAÇÃO
DA DOR
ELE TEM BRAÇOS DE ACOLHER
SEMPRE RECORRO A ESSE ACONCHEGO
QUANDO A SALA DA SOLIDÃO, FICA FRIA DEMAIS
ASSIM VOLTO A TONA DESSE MERGULHO
SEMPRE MAIS FORTE
MAIS OUSADA
MAIS EU