Quem sabe?
Joguei o pente na mesa, mas nada é fácil na vida, então ele caiu e rolou para debaixo da estante.
Encontrei minha cerveja favorita em promoção,
mas nada tem que ser fácil, então ela estava quente como o diabo.
Encontrei algo parecido com o amor pela estrada, mas como essas coisas que envolvem o peito não são fáceis, ela se foi levando tudo o que eu tinha de bom.
Passei no vestibular, e como nada é simples, após dois anos de faculdade, descobri que não era o curso que eu queria.
Achei um livro na internet, desses difíceis de encontrar e com um frete absurdo, mas como as coisas tem que ser complicadas, me enviaram o livro errado.
Consegui sair de casa cedo para o primeiro dia no emprego novo, mas como nada pode ser fácil, peguei o ônibus errado.
Por um acaso, encontrei outra para quem entreguei meu resto de coração. Mas não pode ser fácil o que faz a felicidade de um homem, então o mundo a levou para onde minha saudade não pode mais tocá-la.
A inspiração para um poema que talvez fosse um fodão me trombou de repente, mas nada é como queremos, então quando peguei o papel e uma caneta bic quase descarregada, as palavras se foram.
Veja,
são as sucessões de pequenas e corriqueiras tragédias humanas como essas, que desencadeiam a dor, o desespero, a loucura, a tristeza, as guerras, os suicídios, os massacres, o fanatismo religioso…
Não julgue mal o próximo melancólico que você ver ou ler.
Quem sabe quantas cervejas quentes murcharam em suas mãos?
Quem sabe quantas vezes o seu coração foi estraçalhado?