QUASE PERDÃO
Saber-se parte de uma outra vida,
tornar-se pedaço de outra vontade,
estar no prato do amor feito comida,
tomar o lugar da mentira e ser verdade...
Ver partir a nau que seu amor leva
é dar-se, por inteiro, à saudade,
pedir e sentir que o amor te nega,
mesmo que a ti seja a mais pura maldade...
O porto vazio, a imensidão do cais,
a desventura a crepitar seu fogo,
ouvir duas palavras - nunca mais,
deitar o Rei, saber perdido o jogo...
Desvencilhar-se daquilo que foi tudo,
reparar cada fenda n'alma ferida,
ouvir de longe o que lhe diz o mundo,
viva o que te sobra, sua parca vida...
Erguer a face e traduzir o que sente,
o mapa para dois agora uma só ilha,
o pensamento sim, o coração não mente,
na alma a dor como se fosses pai, ela, a filha...
Quando menos se espera a voz que ouviste
te chega aos ouvidos e te dá o quase perdão,
diz que fará por amor e por tanto que insistes,
mas que deixará em vigília o machucado coração...