Podres Poderes
Um dia o poder estabelecido
levará o pensamento à dormência.
E convocará os grandes idiotas
para provarem que os quadrados são redondos.
E então, estupidamente,
os quadrados serão redondos
e os grandes babacas serão tomados por gênios.
Neste momento,
o poder tomará em matrimônio
a noiva, conhecida por Ideologia.
E de tal enlace nascerão pequenos titãs,
deuses mitológicos que revelarão as ‘verdades’.
Sejam estas verdadeiras ou não, basta a força,
basta a imposição, por sutilezas ou pura pancada.
Haverá de produzir uma moral das conveniências.
Apunhalarão a ética e a colocarão a seu serviço.
Não suficiente, imporão sorrisos às faces.
E quem não rir sofrerá incisão cirúrgica.
E os músculos dominados mostrarão os dentes.
E então o que era subliminar será franco.
E o profundamente patético estará realizado.
Para completar a obra,
recorrerão ao auxílio dos demônios e dos pecados,
e terão a chave do céu e do inferno.
Anuências serão vendidas a preços ‘módicos’.
Quanto não vale ir para o paraíso,
seja lá bem o que for isto?
Enfraquecerão a fé entre Criador e criatura
com suas rezas de carpideiras profissionais.
Serão antes mágicos do que sacerdotes,
serão antes hipócritas do que teólogos.
Os vendilhões do Templo serão os donos do Templo.
E daí? Pouco aqui se faz, meras linhas anárquicas,
no caos mundano da alma indignada, encarcerada no corpo.
Poema onde misturam-se amor e ódio, mas é essência de amor.
Isto bem pouco importa, vale o anacronismo formal,
num descaso onde o meio perdeu-se do fim,
onde lágrimas tiveram a sensata vergonha de não cair,
pois na face brutalmente construída pelo bisturi,
o sorriso não expressa nada, apenas dentes.
Mas em algum lugar na alma, sagrada ira clama por bênçãos.
Mas não consegue ficar livre de pedir maldições.