Fim de expediente
Escrever sobre bundas salvadoras
e fodas bem ou mal sucedidas,
sobre o âmago da poesia e os seus mortos,
sobre drogas, bebidas e rompimentos
não é muito diferente
do que escrever sobre um perfeito vaso chinês,
sobre a infeliz Ismália em sua torre,
sobre um emprego inútil
sobre a fome de amor
sobre a raiva...
Agora vejo,
essa luta incompreensível
contra uma folha de papel
ou uma impiedosa tela branca
que jamais se cansa
trata-se de uma luta contra você mesmo,
uma luta contra o prazer e o tormento da senciência.
Ninguém lá fora me ouve,
a minha música de fundo são os ecos de seus passos
e de suas vozes.
Mas não estou lá e nem aqui.
As teclas que aperto mal fazem ruídos.
As palavras, quando escritas,
são como enormes serpentes cegas e venenosas,
são como animais selvagens andando de jeans pelo centro da cidade grande.
O frio dessa sala tem o mesmo cheiro de solidão
que sinto em algumas pessoas
que passam por mim nas ruas,
tem o meu cheiro.