UM ROUXINOL CANTOU-ME ESTAS COISAS...
Esquecer é amar solenemente.
metamorfoses: o íngreme fruto
despenca da jaqueira que demorou sono de
roça.
Vovó já não me reconhece mais. Alzheimer. Ainda assim, mexe os tachos, esfria, traz-me anilinas com cocadas.
Vez em quando, o sabor de óleo, corantes e cascas de bananas podres
me deliciam.
- Quem é você, menino?
(Suas rugas relaxadas em sorriso arruínam as maldades do mundo).
Ontem, surrei meu filho de apenas três anos.
A noite, o braço franzino volveu-me e o pijaminha roçou em meus pelos.
Hoje:
- Chuta a bola, papai! Chuta a bola!
(Perdi o pênalti, propositalmente).
Minha vizinha espera seu ex-marido voltar do Pará
há vinte anos:
- Coloquei colcha nova na cama, essências de aroeira pela casa, biscoitos no pote.
(Ele já morreu).
A Praia de Itaparica engole veleiros.
- Mulher, ainda tem peroá no freezer?
(Jantaram ovos e cebolinha picada).
O Cinema no Centro da Cidade fechou as portas
Domingo sempre tinha procissão
Amanhã, piquenique no parque
Risquei todos os meses do calendário
Você ainda me ama?
Solenemente!