UM ROUXINOL CANTOU-ME ESTAS COISAS...

Esquecer é amar solenemente.

metamorfoses: o íngreme fruto

despenca da jaqueira que demorou sono de

roça.

Vovó já não me reconhece mais. Alzheimer. Ainda assim, mexe os tachos, esfria, traz-me anilinas com cocadas.

Vez em quando, o sabor de óleo, corantes e cascas de bananas podres

me deliciam.

- Quem é você, menino?

(Suas rugas relaxadas em sorriso arruínam as maldades do mundo).

Ontem, surrei meu filho de apenas três anos.

A noite, o braço franzino volveu-me e o pijaminha roçou em meus pelos.

Hoje:

- Chuta a bola, papai! Chuta a bola!

(Perdi o pênalti, propositalmente).

Minha vizinha espera seu ex-marido voltar do Pará

há vinte anos:

- Coloquei colcha nova na cama, essências de aroeira pela casa, biscoitos no pote.

(Ele já morreu).

A Praia de Itaparica engole veleiros.

- Mulher, ainda tem peroá no freezer?

(Jantaram ovos e cebolinha picada).

O Cinema no Centro da Cidade fechou as portas

Domingo sempre tinha procissão

Amanhã, piquenique no parque

Risquei todos os meses do calendário

Você ainda me ama?

Solenemente!

Italo Samuel Wyatt
Enviado por Italo Samuel Wyatt em 16/04/2019
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