perguntas

perguntei ao editor do jornal

ele negou que sabia, disse que disso não falaria

perguntei ao reitor da universidade

ele estava por demais ocupado

perguntei ao juiz do fórum

ele disse que era muito relativo, dependia das provas materiais

perguntei ao carteiro que distribuía cartas

ele disse que há muito não entregava nada parecido

perguntei ao homem de rua com seus cães

ele se riu de mim

perguntei ao sacerdote

respondeu-me que eu tinha que ter fé

perguntei a um banqueiro

e ele me perguntou se isso dava algum dinheiro

perguntei ao comandante do quartel

ele perguntou se eu estava a ameaçar a paz e a segurança

perguntei ao professor doutor

ele espiou-me, com jactância e desdém, por sobre os óculos

perguntei ao homem público na casa de leis da cidade

ele disse que com certeza responderia após as eleições

perguntei ao erudito mais erudito da cidade

ele me recomendou ler seu último livro

perguntei ao adolescente que absorto dedilhava o celular

pediu-me para esperar, e então pôs-se de repente a gargalhar

perguntei ao empresário rico e afamado

que, contrariado, quis saber a quê aquilo servia

perguntei ao poeta, ele disse que tal mote

revolve a verve e não devolve poema

então, já sem saber a quem perguntar

perguntei a um generoso idoso, muito idoso

ele disse que um dia isso fora ditoso

mas agora já não sabia responder

e que talvez, quem sabe

em noite límpida sem lua no sertão

entre as estrelas se encontrasse a razão

Publicado no livro "coice de mula" (2018).