O QUE RESTA
O que resta àquele que escreve
senão apagar o que já foi escrito,
saber que tudo se faz tão breve
como o vento leva o que foi dito,
em branco a face do papel a esperar,
ansiosa, por receber o inaudito,
por terra, ar ou então, mar?
O que resta àquele que ama
senão mais amar e amar mais ainda,
os lábios do coração a assoprarem a chama
e a saudar a sensação de calor, bem-vinda,
a mão a acenar a quem desfaz a gana
das intempéries, a afastar o que não finda,
cada fio em seu lugar, da antiga trama?
O que resta àquele poeta na montanha
a espiar a cidade que o espia, curiosa,
senão aguçar seus sentidos, sua sanha,
retratar os traços da poesia ansiosa,
saber que perder palavras versos ganha,
estar pleno é a vivacidade mais poderosa
que tudo desvenda, simples ideia ou estranha?