ALMA SURDA
O vento que pensas passar por ti,
na verdade sai do teu corpo.
Ele é tua alma profunda,
uma aparição que se move
porque espera dizer algo,
te fazer respirar o ar marinho
da inocência amorosa,
te cantar um lamento
para se abeirar como uma aliança exata.
Tua surdez, no entanto, solta um uivo,
dor revolvida que fica.
O vento que pensas passar por ti
é tua alma adolescente
quer brilhar a noite,
quer te encantar,
como flor espontânea,
mas das suas pétalas
surgem um acúmulo de dores rumorosas,
que são amores sem matizes.
A viração que sai de ti
não sabe te fazer amar.
Mas resta sempre teu fantasma
ele atravessa as paredes,
declama o verso rejuvenescido
para a musa que encontrarás,
porque tu aspiras e expiras o brilho lúcido
do cigarro aflitivo da poesia.
Do livro:Adversos e outros momentos