ESTADO DE POESIA
Uma coisa é você se achar grande, imponente,
a mais alta montanha de todo o continente,
o morro mais alto de onde se espia a cidade desmontada,
a antena que descobre segredos de cada alma condenada
a ir e vir nessa esteira de porcas e roscas e parafusos,
pensar estar acima da mais alta prateleira da biblioteca,
se imaginar cerebralmente perfeito entre seres confusos,
pensar estar vestido (como aquele Rei), e sair de cueca
entre cegos obliterados e olhares malversados e difusos...
Outra coisa é você descobrir o seu verdadeiro tamanho,
nem mais nem menos que um grão de cevada ou cânhamo,
destituir o ego de suas nobres e enganosas considerações,
retirar do centro de sua inteligência ventosas em disfunções,
repor o que lhe é suficiente para alcançar o tamanho exato
da régua dos seus sonhos medidos pelos seus próprios atos,
ver sem medir, medir sem usar régua de qualquer medidura,
vislumbrar no fim do labirinto o espelho de sua loucura
a encetar batalhas entre o que é e o que pensas ser,
justamente para poder enfrentar o combate e vencer...
Se nem uma ou nem outra,
repare nas filigranas que saem do céu da boca,
todo dia,
repense seu vocabulário
e retorne imediatamente ao estado de poesia...