Um dia

Quem tenta consegue

Faz, encontra meios e engana a quem no mais intimo não se tem intenção de enganar

Com a certeza de quem crê com fé

Com a convicção de mil legiões a meu dispor

Quis tanto ficar só

Que sou agora inteiramente meu

De mais ninguém

Inteiro a meu dispor

Vossa excelência está satisfeito agora?

Agora que tens todo o pouco que sou em essência para ti

Nada, nem ninguém

Inteiramente inacessível

Não há se quer um cão na rua que não tenha quem le olhe com desejo de cuidar

Porém agora sou eu o cão vadio

Sentado numa mesa de bar

Bebendo a cerveja dos envergonhados

A maior humilhação que pode acontecer a um homem é ver-se derrotado por seus sonhos

É sentir-se coitado para si

É mais que xingamento

E sentir repulsa por si

Hoje não tenho pai, nem mãe

Tenho irmãos quanto o ventre materno pode dar

Mas que sei eu deles?

Que sei dos seus caminhos e dos seus anseios?

O que pude lhes fazer não fiz

No que pude lhes socorrer deixei-os desamparados

Pobre é o homem que tendo família à renega por caprixo

Pobre é a alma que procura estar sozinha e consegue

Estou hoje lucido e vencido como Pessoa

Me perdi em mim e não sei como me achar

Mergulhei no que vislumbrei em sonho como coisa real e agora não há chão para pisar

É só mais uma noite dentro de uma semana e um mês, em um ano e uma decada perdida

Uma vida vã

Que um dia há de passar

E se extinguirá para todo o por vir

Sem desilusão, sem humilhação, sem frustração

Sem mal aos outros

Um dia há de passar

Um dia...